4. Educom analisa: é possível separar a nossa cultura em cores?

“É um passado que se estuda tocando em nervos, um passado que emenda com a vida de cada um; uma aventura da sensibilidade, não apenas um esforço de pesquisa pelos arquivos”.[Gilberto Freire, à edição de Casa Grande & Senzala]
O NEGRO NO BRASIL: CULTURA, ARTE E RELIGIÃO
O prof. Dr. Ismar de Oliveira Soares coloca em seu livro “Educomunicação: O conceito, o Profissional, a Aplicação” nosso interesse na interdisciplinaridade e integração de conhecimentos, na proposição de eixos temáticos e da participação dos jovens na construção de seu conhecimento. Temos agora uma tecnologia que nos permite traçar nossos próprios caminhos, lançar pontes e atravessar barreiras até alguns anos atrás intransponíveis. Ao fortalecer a dialogia, a construção coletiva do saber e a visão do educando como colaborador do processo, estaremos avançando mais um passo em direção a uma sociedade mais consciente de si e do outro.
A produção cultural empreendida pelo negro no Brasil faz promover uma reflexão sobre o homem na sociedade. O negro está em todos os cantos, pontos e extremos do universo. Ele está na arte, literatura, na religião, na televisão, internet e dentro do povo brasileiro, que faz comunicar para o mundo a cultura que chegou em terras brasileiras por volta do século XVI. Do continente africano, berço da humanidade, milhões foram transplantados para servirem de mão de obra nas lavouras de cana-de-açúcar e café. Mas, o que ficou internalizado em suas memórias foram  práticas culturais e religiosas que, por milênios, foram transmitidas de geração a geração.  
No Brasil, Jardim do Éden, foi o solo fértil quem mais contribuiu para o desenvolvimento das raízes dessa árvore do conhecimento, criando ramificações que se estendem da arte até a fé. São várias as características estéticas africanas que estão ligadas às produções artísticas brasileiras. A cultura popular é espontânea e consumo do grupo que a produz. A expressão estética serviu à criação da cultura e à formação de identidades culturais (individual e coletiva); importante elemento para a compreensão da transitividade e intransitividade dos signos estéticos. A percepção, segundo Fayga Ostrower (2011), concorre a um tipo de conhecer: aprender o mundo externo junto com o mundo interno, interpretando aquilo que está sendo apreendido (tudo ao mesmo tempo). Assim, no que se percebe, interpreta se e, no que se apreende, compreende-se.  
     Não se trata apenas de uma manifestação com fins funcionais – voltado ao lucro, ao olhar não sacralizado do turismo de massa – que deteriora o patrimônio tangível e intangível da nação brasileira. Vai além! Está presente na raiz que vai do sertanejo até o “mestiço neurastênico do litoral” como dizia Euclides da Cunha em “Os Sertões” (1902), ou seja, o homem da cidade. A origem etimológica do léxico patrimônio vem do latim patrimoniu, associado à ideia de herança paterna ou bens de família. Envolve tanto o papel da memória e tradição na construção de identidades coletivas, quanto os recursos a que tem recorrido os Estados modernos na objetivação e legitimação da ideia de nação. No final do século XVIII, o Estado assumiu, em nome do interesse público a proteção legal de determinados bens carregados do simbolismo da nação, definindo o conceito de patrimônio histórico e artístico nacional (Fonseca, 1997:49).   
        
    O patrimônio imaterial e conceito de nação carregam os símbolos dos acontecimentos históricos de todo um povo. Sobretudo, povos de origem africana que se estabeleceram no interior do estado de São Paulo para o trabalho nas lavouras de café. Não foram muitos os estudos para mapear a trajetória dos escravos em São Paulo. Porém, nas regiões de Piracicaba, Campinas e Capivari a expressiva presença de populações negras (quilombos) deixaram muito visível a herança legada por aqueles antigos paulistas. As histórias dos descendentes daqueles negros que foram arrancados da “Mama África”, ou trazidos de outros polos do Brasil, não podiam deixar de ser marcadas pelo dedo cruel da escravidão e pela exclusão. Porém, suas formas de luta e de resistência revelam personalidades de extrema força, e expressam – especialmente na religião, música e dança – uma cultura viva e organizada, que acabou sendo partilhada entre negros e brancos.     As tradições africanas, de um modo geral, seja qual etnia for, têm como a ancestralidade algo fundamental ligado à questão da religiosidade. O tambor que emite um som grave tem uma função que não está ligada somente à este mundo, porém, torna-se um comunicador com os ancestrais antepassados e com os vivos. Além de relatar as crônicas dos vivos, ajudam a trazer à tona as memórias dos falecidos que trouxeram a cultura ao solo brasileiro, energizando seu cotidiano e fortalecendo a luta pelo orgulho negro. Muitos pesquisadores das tradições africanas propõe essas práticas, artística e religiosa, como uma espécie de folclore. O conceito de folclore alcança todo um complexo de vida social, dos saberes e “fazeres” populares, que abarcam as crenças e superstições, passando pelos usos e costumes, linguagens, brincadeiras, artes, técnicas, música, literatura, cultura infantil, entre outros. Nos últimos anos, esses saberes têm sido nomeados, como fazemos aqui, cultura popular, cultura tradicional popular, e cultura popular de tradição oral. Por outro lado, grande número de leigos estigmatizam essas práticas como bruxaria, reunião ou evocação de maus espíritos, macumba, etc. A macumba, por exemplo, estigmatizada e estereotipada por essa categoria de pessoas, significa simplesmente um instrumento de percussão, cuja matéria prima é extraída de uma árvore de origem africana e que leva o mesmo nome: macumba.
TEXTO ORIGINAL: Rosemeire Lopes da Paixão
TEXTO ADAPTADO: Elisa Canjani
ÍNDICE DE IMAGENS:
CHAMADA:
By André Koehne [GFDL (http://www.gnu.org/copyleft/fdl.html), CC-BY-SA-3.0 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/) or CC BY-SA 2.5-2.0-1.0 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/2.5-2.0-1.0), via Wikimedia Commons
1. Assetamento sagrado de Obaluaye. By Toluaye (foto by user: User:Toluaye)
[Public domain, GFDL (http://www.gnu.org/copyleft/fdl.html) or CC-BY-SA-3.0  (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/) , via Wikimedia Commons
2. Kilondira. Por autor desconhecido – Joãozinho da Goméia e Kilondira., CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=34477
By Lionel Scheepmans (Own work) [CC BY-SA 3.0 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0) via Wikimedia Commons
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro. Paz e Terra, 1987.
FONSECA, Maria C. Londres: O patrimônio em processo: Trajetória da política federal de preservação no Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ, 1997.
MELGAÇO Barbosa, Ycarim: O despertar do turismo: um olhar crítico sobre os não lugares. São Paulo, Ed. Aleph, 2004.
OSTROWER, Fayga: Criatividade e Processos de Criação, 26 ed. Petrópolis, Ed. Vozes, 2011.
PELLEGRINI Filho, Americo & T. IKEDA, Alberto: Terra Paulista – Celebrações populares paulista: do sagrado ao profano. São Paulo, Imprensa Oficial, 2004.
Secretaria de Cultura do Governo do Estado de São Paulo. O Brasil de Todos os Negros. Revista Cultural, ano II, n. 13, maio/2000
Universidade de São Paulo. Dossiê Povo Negro – 300 anos. Revista USP, n.28, dezembro/fevereiro 95/96

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